Policiais presos formavam “quadrilha” parceira do PCC, diz MPSP
São Paulo — Policiais civis de São Paulo, incluindo um delegado e o chefe de um núcleo especializado em investigar o crime organizado na zona leste paulistana — uma das principais áreas de atividades do Primeiro Comando da Capital (PCC) — são apontados em denúncia do Ministério Público de São Paulo (MPSP) como integrantes de uma quadrilha que estaria envolvida com crimes de homicídio, lavagem de dinheiro, crimes contra a administração pública e “outros delitos de extrema gravidade”.
Em consequência da denúncia, foram presos nessa terça-feira (17/12) — em uma ação conjunta da Polícia Federal e do MPSP — o delegado Fábio Baena, o chefe de investigações do Corpo Especial de Repressão ao Crime Organizado (Cerco), da 5ª Delegacia Seccional, Marcelo Marques de Souza, o também investigador-chefe Eduardo Monteiro e o investigador Marcelo Roberto Ruggieri.
Rogério de Almeida Felício, o Rogerinho, policial civil cuja prisão também foi decretada, nessa terça, estava foragido até a publicação desta reportagem.
“A referida organização criminosa [dos policiais civis] atuaria em conjunto com o PCC, maior facção criminosa que atua dentro e fora dos presídios nacionais”, diz trecho do pedido de prisão dos policiais, feito pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).
No documento, o juiz Paulo Fernando Deroma de Mello, da 1ª Vara de Crimes Tributários, Organização Criminosa e Lavagem de Bens e Valores, destaca que “nenhuma máfia ou facção criminosa” atinge o “status que o PCC atingiu” sem uma “efetiva participação de agentes públicos, notadamente aqueles ligados à Segurança Pública do país”.
Os policiais foram incluídos no hall de suspeitos de envolvimento no assassinato do corretor de imóveis Vinícius Gritzbach, fuzilado em 8 de novembro, no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos, na região metropolitana.
Antes da execução, Gritzbach havia feito uma delação premiada, na qual mencionou o nome dos policiais presos nessa terça.
Sobrinho da corregedora-geral
O investigador-chefe Eduardo Monteiro é apontado, no pedido de prisão da Justiça paulista, como um dos policiais que usava relógios de luxo, apreendidos e não devolvidos a Vinícius Gritzbach, após o cumprimento de um mandado de busca e apreensão em um imóvel do corretor.
O policial também teria realizado a apropriação de um sítio, “de origem criminosa”, além de extorquir membros do PCC “para que eles não fossem investigados por crimes de homicídio”.
Quando fazia essas negociações, Eduardo Monteiro chefiava as investigações do Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP), onde um caso de duplo homicídio, de dois membros do PCC, teria tido dois suspeitos “dispensados” após o pagamento de R$ 11 milhões ao delegado Fábio Baena, chefe de Monteiro.
Ambos teriam tentado extorquir R$ 40 milhões de Gritzbach, para retirar o nome do corretor do inquérito policial do duplo assassinato. O pagamento não foi feito, no entanto, e a tentativa de suposta extorsão relatada na delação premiada.
Delegado do DHPP
Fábio Baena foi mencionado diversas vezes por Gritzbach na delação, incluindo “na subtração de diversos relógios de luxo”.
O MPSP aponta, na denúncia que resultou na prisão dos policiais, que Fábio Baena teria afirmado a Grizbach, em uma conversa, que o “ajudaria”, e que “não esqueceria dele”.
Fábio Baena, segundo o TJSP, ainda é investigado em outros casos de corrupção de policiais, no “cometimento de crimes gravíssimos”, além de envolvimento na apropriação do mesmo sítio que Eduardo Monteiro.
“[Ele] também teria recebido propina para livrar outros criminosos perigosos do PCC de eventuais investigações”.
Policial ajudando bandido
Marcelo Roberto Rugigieri é outro policial civil apontado como membro da “quadrilha”. Ele teria, ainda segundo as investigações, “estreitas ligações” com membros do PCC.
O investigador já foi condenado por ajudar na confecção de documentos falsos, usados por criminosos.
O MPSP ainda destaca “inúmeras conversas” entre o policial e “criminosos do PCC”, que “juntos praticavam infrações penais”.
Os crimes feitos em parceria entre o policial e os bandidos não forma especificados, no documento obtido pelo Metrópoles.
Investigador do crime organizado
O chefe de investigações Marcelo Marques de Souza — que coordenava um núcleo especializado em apurar as ações do crime organizado na zona leste paulistana — é apontado pelo MPSP “como integrante da organização criminosa ora investigada”.
Da mesma forma que os outros policiais presos, Marcelo Marques é sócio em empresas, obtendo sucesso na vida empresarial, “denotando absoluta incompatibilidade patrimonial com os vencimentos de policial civil”.
Ele também é mencionado por Gritzbach na delação premiada e suas movimentações financeiras, suspeitas, já foram identificadas pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).
Na casa dele, a PF e o MPSP apreenderam R$ 200 mil em dinheiro, durante a operação dessa terça-feira.
O foragido
O outro policial que compõe o núcleo de policiais, envolvidos em crimes com o PCC, é Rogério de Almeida Felício, o Rogerinho. Ele seguia foragido, até a publicação desta reportagem.
Como revelado pelo Metrópoles, com salário de R$ 7 mil, Rogerinho é sócio de uma clínica de estética, de uma empresa de segurança privada e de uma construtora que ergueu cinco condomínios de 37 casas no litoral sul paulista.
Defesa
Em nota ao Metrópoles, a defesa de Baena e Monteiro afirmou que a prisão foi arbitrária e midiática. “A palavra pueril de um mitômano, sem qualquer elemento novo de prova, não poderia jamais motivar medida tão excepcional”, diz a defesa, em referência a Gritzbach.
“Ambos compareceram espontaneamente para serem ouvidos e jamais causaram qualquer embaraço às repetidas investigações”, diz a nota. O Metrópoles busca a defesa de Rogério Felício. O espaço está aberto para manifestação.
Operação policial
A Operação Tacitus, deflagrada nessa terça-feira, cumpriu oito mandados de prisão e 13 de busca e apreensão. O objetivo foi desarticular organização criminosa voltada à lavagem de dinheiro e a crimes contra a administração pública (corrupção ativa e passiva).
Os mandados foram cumpridos nas cidades de São Paulo, Bragança Paulista, Igaratá e Ubatuba.
Segundo o MPSP, provas obtidas em diversas diligências revelaram como os investigados se estruturaram para exigir propina e lavar dinheiro para suprir os interesses do PCC.
Os investigados vão responder pelos crimes de organização criminosa, corrupção ativa e passiva e ocultação de capitais, cujas penas somadas podem alcançar 30 anos de reclusão.