STF interrompe julgamento do marco temporal; Mendonça indica empate no placar
O Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu a análise do marco temporal para demarcação de terras indígenas, retomada nesta quarta-feira (30). Ela terá continuidade nesta quinta-feira (31).
O julgamento foi interrompido durante a análise de André Mendonça, que indicou que votará a favor da tese defendida por ruralistas e rejeitada por indígenas.
Se seguir desta maneira, irá empatar o placar em 2 a 2.
*em atualização
Entenda o que é o marco temporal
O marco temporal é uma tese jurídica defendida por ruralistas e que contraria os interesses das populações indígenas. Ela determina que a demarcação de uma terra indígena só pode acontecer se for comprovado que os indígenas estavam sobre o espaço requerido em 5 de outubro de 1988 – quando a Constituição atual foi promulgada.
A exceção é quando houver um conflito efetivo sobre a posse da terra em discussão, com circunstâncias de fato ou “controvérsia possessória judicializada”, no passado e que persistisse até 5 de outubro de 1988.
O tema tem relevância, porque será com este processo que os ministros vão definir se a tese do marco temporal tem validade ou não. O que for decidido valerá para todos os casos de demarcação de terras indígenas que estejam sendo discutidos na Justiça.
Votos anteriores
O relator do caso, Edson Fachin, manifestou-se contra o marco temporal. Para o magistrado, que apresentou seu voto em 2021, a Constituição reconhece o direito de permanência desses povos independentemente da data da ocupação.
O ministro Nunes Marques, por sua vez, votou a favor da tese. Considerou que o marco deve ser adotado para definir a ocupação tradicional da terra por indígenas. Em sua justificativa, ele disse que a solução concilia os interesses do país e os dos povos originários.
Quando a Corte retomou o julgamento, em junho deste ano, só Moraes votou. O magistrado foi contra a validade da tese do marco temporal, mas propôs uma espécie de conciliação entre os interesses de povos originários e ruralistas.
Entre as propostas, há a possibilidade de indenização prévia a fazendeiros que tenham ocupado de boa-fé territórios reconhecidos como de tradicional ocupação indígena.
Diferente de como é hoje, em que os ocupantes da terra têm direito a indenização por eventuais benfeitorias feitas no território, Moraes propôs que eles sejam indenizados também pelo valor da terra em si.
O ministro também defendeu a possibilidade de haver uma “compensação” aos povos originários, para terras em que houver uma ocupação “consolidada” por não indígenas, em que a demarcação seja contrária ao “interesse público”. Nesses casos, seria concedido aos indígenas um território equivalente ao de tradicional ocupação.
Entidades e organizações indígenas reconhecem a importância de Moraes ter votado para invalidar a tese do marco temporal, mas criticam as medidas propostas pelo ministro. Para esses grupos, o voto de Moraes possui contradições e pode prejudicar a proteção dos povos originários.
Entenda o julgamento do marco temporal
O processo do marco temporal em discussão no STF teve sua repercussão geral reconhecida em 2019. Isso significa que a definição adotada pela Corte servirá de baliza para todos os casos semelhantes em todas as instâncias da Justiça.
O caso concreto é uma ação do Instituto do Meio Ambiente do Estado de Santa Catarina (IMA) contra o povo Xokleng, da Terra Indígena Ibirama-La Klaño.
O território fica às margens do rio Itajaí do Norte, em Santa Catarina. Da população de cerca de 2 mil pessoas, também fazem parte indígenas dos povos Guarani e Kaingang.
O governo catarinense pede a reintegração de posse de parte da área, que estaria sobreposta ao território a Reserva Biológica Sassafrás, distante cerca de 200 quilômetros de Florianópolis.
A data da promulgação da Constituição Federal – 5 de outubro de 1988 – é o ponto central da tese do marco temporal. No artigo 231 da Carta Magna, está estabelecido o seguinte:
São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens
A proposição de um marco temporal já havia sido ventilada antes, mas ganhou tração a partir de um precedente que apareceu em julgamento do próprio STF, em 2009, quando a Corte julgou a demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima.
Na ocasião, os ministros entenderam que os indígenas tinham direito ao território, porque estavam no local na data da promulgação da Constituição.
A partir daí a tese passou a ser mobilizada para os interesses contrários aos indígenas: ou seja, se eles poderiam também pleitear as terras sobre as quais não ocupassem na mesma data.
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