Mensagens apontam que membros da PRF discutiram embasamento legal de autuações em operação
Uma troca de mensagens entre um diretor e um coordenador da Polícia Rodoviária Federal (PRF) indica que foi discutido o embasamento legal para autuações na operação no segundo turno das eleições 2022. O diálogo foi incluído no ofício da Polícia Federal (PF) para a ação que prendeu o ex-diretor da instituição Silvinei Vasques.
A conversa por áudio referenciada pela PF ocorreu entre Adiel Pereira Alcântara, então coordenador de análise de Inteligência da PRF, e Luís Carlos Reischak, então diretor de Inteligência da PRF, no dia 19 de outubro de 2022.
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Reischak ressaltou que a operação seria realizada apenas no domingo, dia da votação, o que descreveu como “operação de segurança viária”.
A Polícia Federal destacou um trecho no qual foi mencionada abordagem, por exemplo, de “transportes de passageiros que saem de São Paulo e vão para o Nordeste”.
Alcântara citou, então, a autorização do ministro Luís Roberto Barroso para que fosse liberado transporte gratuito de eleitores no dia da votação, o que deveria ser “considerado pelo efetivo ostensivo, porque vai ser difícil caracterizar o transporte clandestino de eleitor, né?”, complementou.
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Veja abaixo a transcrição da conversa entre os agentes da PRF
Luís Carlos Reischak, então diretor de Inteligência da PRF
“Vou ver se eu consigo cem mil aqui, mas assim, Adiel, o que ficou definido pelo Diretor: é a operação vai ser domingo só, uma operação de segurança viária, tá?
É, não vai ter grandes mobilizações no pré, né? Talvez uma coisa e outra assim, mas o foco vai ser o dia D, tá?
Então a gente tem que, assim… segurança viária, esses transportes clandestinos de passageiros e eu acho que ela é uma operação muito ostensiva, né?
Eu fico com medo da gente entrar com muita força e o colega achar que todo o trabalho vai vir da Inteligência, eu acho que a gente pode atuar de forma complementar, mas ela é ostensiva, ela é pista, né?
Verificar aquele caminhão transportando pessoas e fazer abordagens, aplicar o CTB [– Código de Trânsito Brasileiro –], ah, se a gente puder fazer alguma coisa de Alerta Brasil [– projeto de monitoramento de veículos nas rodovias federais por meio de câmeras com leitor de placas –] acho que dá pra fazer, tentar fazer algum cruzamento, alguma identificação, né?
Aqueles transportes de passageiros que sai de São Paulo e vão pro Nordeste, por exemplo, se a gente conseguir identificar, mas eu vejo muito complementar e aí é melhor a gente tirar o foco da Inteligência, porque senão vai ficar aquela cosia, os colegas vão ficar esperando uma informação, é muito difícil extrair do sistema, fazer esses cruzamentos, como é que a gente vai saber se um transporte de passageiros é irregular ou não, né, pelos sistemas, e aí daqui a pouco tirar o pé, né.
então, assim, é presença ostensiva e o foco no dia D, então talvez a gente não precise montar toda uma estrutura, né?
Então eu acho que montar em Brasília, tem a questão do pós ali também e focar nos estados, talvez um dia antes, entendeu, no sábado, para preparar alguma coisa e no domingo também no simultâneo ali, entendeu?
Então por isso que eu acho que talvez esses oitenta mil sejam suficientes”
Adiel Pereira Alcântara, então coordenador de análise de Inteligência da PRF
“Perfeito, chefe. Acho que é bom e assim, acho que a gente tem que levar em consideração também essa decisão recente do Barroso que liberou o transporte gratuito de eleitores né no dia 30, então isso vai ser um fator que deve ser considerado pelo efetivo ostensivo, né?
Por que vai ser difícil caracterizar o transporte clandestino de eleitor, né?
Dada essa, essa gratuidade que foi facultada aí pelo Supremo, enfim, mas eu acho bom, vamos tratar de forma complementar mesmo, amanhã eu vou estar com os (ininteligível) fechar uma ordem de serviço e a gente apresenta pro senhor.”
Ministério da Justiça levantou cidades em que Lula ganhou no 1° turno
No documento, a Polícia Federal explica que as investigações sobre possível interferência nas eleições tiveram início após a oitiva do então analista de inteligência do Ministério da Justiça e da Segurança Pública Clebson Vieira.
Clebson disse que, após o primeiro turno das eleições em 2022, a diretora de inteligência do Ministério na época, Marília Alencar, solicitou a ele que fizesse várias análises estatísticas, dentre elas um levantamento dos municípios nos quais houvesse votação superior a 75% em um dos candidatos à Presidência – Lula (PT) e Bolsonaro (PL).
Segundo Clebson, ele teria percebido que a PRF agiu no dia do segundo turno, em 30 de outubro de 2022, com base nos dados de seu levantamento, com blitze “em municípios ou próximas a municípios nos quais o então candidato LULA tivesse votação acima de 75%”.
A PF destaca que também ouviu Marília Alencar, que confirmou o pedido, mas alegou que os dados seriam confrontados com os partidos políticos dos respectivos prefeitos dos municípios, para procurar indicativos de compra de votos.
Alencar ainda afirmou que apresentou a planilha ao então ministro da Justiça, Anderson Torres, durante uma reunião.
Em seu depoimento à PF, Anderson Torres afirmou que não levou a planilha em questão ao conhecimento da PRF, e que acredita que não houve difusão sequer pelos canais de inteligência.
Segundo Torres, Silvinei Vasquez teria lhe dito que “a ação foi praticamente a mesma do primeiro turno, não tendo havido qualquer direcionamento”.
A CNN tenta contato com os citados a respeito das investigações da PF.
*publicado por Tiago Tortella, da CNN
Este conteúdo foi originalmente publicado em Mensagens apontam que membros da PRF discutiram embasamento legal de autuações em operação no site CNN Brasil.